CHICO LIBERATO Francisco Liberato de Mattos. (Salvador, 08/04/1936 – Salvador, 04/01/2023). Desenhista, pintor, escultor, gravador, cineasta, designer gráfico, foi diretor do Museu de Arte Moderna da Bahia e coordenador de Artes Visuais e Multimeios da Diretoria de Imagem e Som da Fundação Cultural do Estado da Bahia. Formação: Autodidata Período de atividade: 1963 –[...]
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Sites oficiais sobre a vida e a obra de Chico Liberato:
chicoliberato.com.br
chicoliberato.com.br/site/casachicoealbaliberato
CHICO LIBERATO
Francisco Liberato de Mattos.
(Salvador, 08/04/1936 – Salvador, 04/01/2023).
Desenhista, pintor, escultor, gravador, cineasta, designer gráfico, foi diretor do Museu de Arte Moderna da Bahia e coordenador de Artes Visuais e Multimeios da Diretoria de Imagem e Som da Fundação Cultural do Estado da Bahia.
Autodidata
1963 – 2023
Pintor, escultor, desenhista, multimeios
Animação
A OBRA
Artista multimeios e experimental, Chico Liberato trabalhou com linguagens como pintura, desenho, escultura, instalação, animação; testando diversas técnicas e materiais, como madeira, tecido, metal, carne e couro animal, plástico, fibras, nanquim, hidrocor, giz de cera, pigmentação, tintas acrílica e tinta à óleo. No seu acervo há um destaque para a pintura acrílica em tela e papel. Seu trabalho resultou em obras de cinema de animação, quadros, painéis, cenários para espetáculos, peças publicitárias e institucionais, cartazes, capas de discos e livros, logomarcas, jóias e outros produtos.
Liberato é representante da segunda geração de modernistas baianos, que, segundo Ferreira (2016), foi um termo cunhado pela crítica cultural local para denominar um grupo de jovens artistas, a maioria oriunda da Escola de Belas Artes da UFBA, que tinha como característica comum uma tendência ao abstracionismo.
Foi a geração que começou a produzir entre as décadas de 1960 e 1970, no contexto onde houve a criação do MAM da Bahia; a cena das artes visuais baiana mais potente, com galerias de arte e bienais; e o fortalecimento do curso de Belas Artes na UFBA. Ao tempo em que havia mais espaço para experimentações, produção e circulação artística, também havia a necessidade dos novos artistas disputarem esses espaços com os artistas mais tradicionais, acadêmicos, e também com os artistas já estabelecidos da primeira geração de modernistas.
Além de Chico Liberato são parte desta geração Edsoleda Santos, Yedamaria Oliveira, Calasans Neto, Sante Scaldaferri, Riolan Coutinho, Leonardo Alencar, Emanoel Araújo, Jamison Pedra, Eckenberger, Edison da Luz, Vera Lima, Sonia Castro, Gley Melo, Marlene Cardoso, Hilda Oliveira, Elizabeth Roters, Gilberto Oliveira, Ângelo Roberto, entre outros (MACIEL, 2015).
Ao contrário da maioria de seus contemporâneos, Liberato foi autodidata. Começou a desenhar na infância, e em 1963 teve uma única e rápida experiência com o ensino formal de arte no MAM do Rio de Janeiro. Mas tinham em comum um espírito de coletividade, próprio da época, com maior intercâmbio entre artistas brasileiros e estrangeiros, e participação em exposições coletivas, palestras, oficinas, feiras de arte e projetos coletivos.
Segundo Maciel (2015), a obra dos artistas modernos nesta época na Bahia era frequentemente baseada nos símbolos identitários locais, com tendência narrativa, muito em função do mercado forte de encomendas do poder público. A obra de Chico Liberato não se encaixava neste caráter narrativo, representativo de uma subjetividade local genérica.
A obra de Liberato pode ser enquadrada no movimento da Nova Figuração, pelo rompimento formal com a estética modernista construtiva, realista e descritiva, trazendo figuras livres, com características do informalismo, do expressionismo abstrato e da arte pop, com contrastes cromáticos e formas da comunicação de massa, mas com temática politicamente engajada – ao contrário da eventual neutralidade ideológica da Pop Art norte-americana. São representantes deste movimento artistas que participaram da mostra “Opinião 65”, junto com Liberato, como Antonio Dias, Carlos Vergara, Rubens Gerchman, entre outros.
Na sua obra, porém, Chico utilizava uma iconografia rural, sertaneja, em vez da urbana, em cujos temas se destacam o sertão mítico, os desafios de um nordeste subalternizado e a cultura popular da Bahia mais profunda. Uma estética conceitualmente próxima das experiências do grupo baiano Etsedron: a identidade cultural sertaneja e seus contextos sociais.
Como pioneiro do cinema da animação no Brasil, Liberato realizou doze curtas-metragens e dois longas. Entre suas obras para cinema estão: “Ementário” (1972); “Antístrofe” (1973); “O que os olhos vêem” (1973); “Deus não está morto” (1974); “Caipora” (1974); “Pedro Piedra” (1976); “Eram-se opostos” (1977); “Muçagambira” (1982) – Melhor Filme Baiano na XXI Jornada Brasileira de Curta-Metragem; “Boi Aruá” (1983) – Prêmio UNESCO como Referência de Valores Culturais para Infância e Juventude; “Carnaval” (1985) – Prêmio Concine; “Um Outro” (2008); “Ritos de Passagem” (2013) – Festivais de Havana, do Rio e de Lisboa; e “Amarílis” (2015).
A VIDA
Francisco Liberato de Mattos (1936-2023), conhecido como Chico Liberato, artista nascido sob o signo de Áries em 08 de abril de 1936, no bairro do Politeama, em Salvador, viveu e trabalhou na Bahia, Rio de Janeiro e São Paulo. Herdou o nome de gerações de primogênitos juristas e políticos, mas entre estes foi o único a atuar no campo da arte (LIBERATO, 2017).
Grande articulador da cultura baiana, artista visual multimeios e cineasta, Chico foi diretor do Museu de Arte Moderna da Bahia entre 1979 e 1991, onde realizou a potente exposição “Cadastro” como projeto de abertura de sua direção, mostrando o caráter inclusivo e colaborativo que seria sua marca como gestor cultural; e implantou as “Oficinas do MAM”, inspirado por projeto semelhante com grande repercussão, no Parque Laje, sob direção do artista Rubens Gerchman. Foi também coordenador de Artes Visuais e Multimeios da Diretoria de Imagem e Som (DIMAS) da Fundação Cultural do Estado da Bahia (FUNCEB), onde se aposentou como diretor. Foi também vigoroso pioneiro conceitual e formal do cinema de animação no Brasil.
Chico Liberato teve uma infância de liberdade, veraneios no Recôncavo da Bahia, desenho, natação e futebol – esportes que praticou durante toda vida. Na juventude frequentava a cena cultural de Salvador, museus, galerias, exposições, ateliês, cinemas, e noites boêmias, enquanto durante o dia trabalhava no comércio com seu tio Pedrinho, próspero comerciante.
Bem jovem, não obstante a boa situação financeira, guardava uma crescente insatisfação por ter abandonado os desenhos, pelos quais era conhecido entre seus companheiros do Colégio Sofia Costa Pinto, atendendo-os nos trabalhos escolares e nas histórias de super-heróis que criavam.
No final dos anos 1950 foi gerenciar uma fazenda em Una, no sul da Bahia, com mata Atlântica ainda habitada por Tupinambás. Nela vivencia uma intensa imersão na natureza na cultura desse povo originário. Ali iniciou plantio de extenso seringal, a partir das primeiras sementes da planta na região, distribuídas por uma indústria americana de pneus.
Conviveu de maneira fraterna com os nativos do lugar, cedendo-lhes terra, apoiando o trabalho, e construindo laços de amizade. Porém crescia nele a inquietude por novo rumo, que se revela inadiável certo dia, após longa travessia desde Ilhéus – onde se abastecia e visitava a familia da irmã Denise – indo de burro pela praia, depois passando pela mata fechada por horas. Chico pára para descansar e tem a certeza de que, apesar do amor à natureza, aquele ainda não era seu lugar. Já em Ilhéus, na casa da irmã, rasga todas as obras feitas nas suas breves estadias, menos uma, que conservou consigo. Retorna a Salvador e se prepara para um novo ciclo.
Mudou-se para o Rio de Janeiro no início dos anos 1960, hospedando-se na casa da tia Detinha e tio Onaldo, que considerava um conselheiro. Foi recebido afetuosamente por eles e pelas primas Adélia e Aninha, que lhes apresentaram os Beatles. Os retratos que fez das primas estão conservados até hoje, testemunhas da beleza e liberdade que imprimia ao gênero.
Foi encaminhado pelos tios à loja de Kalma Murtinho, reconhecida figurinista carioca – que trabalhou com nomes do teatro como Ziembinski, Gianni Ratto, Ítalo Rossi, Adolpho Celli, Dias Gomes, Antônio Abujamra, Fernando Torres, Marília Pêra – cuja loja de artesanato em Copacabana era frequentada pelos amigos artistas e intelectuais, e até inspirou um poema de Carlos Drummond.
Neste ambiente cultural, Chico passou a trabalhar produzindo temas visuais que estamparam produtos da loja, e tiveram bastante sucesso. Ali também recebeu muitas encomendas de retratos de amigos de Murtinho.
Ampliando seu círculo de amizades e ganhando mais estrutura, Chico passou a dividir uma casa com outros artistas no Leme. Neste período começou a ser impactado pela face cruel da vida nos morros do Rio de Janeiro, como o episódio da execução do bandido Cara de Cavalo, que marcou o surgimento da Scuderie Le Cocq (semente do que conhecemos hoje como milícia).
Entre março e novembro de 1963 Liberato frequentou o Ateliê de Gravura do MAM do Rio de Janeiro. O Museu de Arte Moderna era um espaço de encontro da efervescente cena cultural do Rio naquele momento, quando vigorava uma atmosfera de coletividade, experimentações e rupturas. Dali surgiram exposições que foram marcos das vanguardas nacionais nas artes visuais, como Opinião 65, Propostas 65, Opinião 66 e Nova Objetividade Brasileira, das quais Liberato participou.
Lugar de experimentação de novas formas de expressão visual, nas oficinas de arte do MAM-RJ foram formadas gerações de artistas brasileiros. Orbitavam o museu artistas oriundos de diversos Estados, como Antônio Dias, vindo da Paraíba; Carlos Vergara nascido no Rio Grande do Sul; Maria do Carmo Secco e Dileny Campos, de Minas Gerais; Raul Córdula, de Pernambuco; Rubens Gerchman, Lygia Clark, Lygia Pape, Hélio Oiticica, entre muitos outros que viriam a ser expoentes de movimentos como arte conceitual, neoconcretismo e nova figuração.
Convidado a participar do grupo de artistas que representou o Brasil na 2a Bienal do Jovem em Paris, a obra de Liberato se destacou aos olhos de André Malraux, notável intelectual e escritor francês. Ele declarou que foi na pintura de Chico onde mais enxergou a identidade brasileira. Essa citação apareceu em matérias de revistas nacionais de grande circulação, nas quais o artista foi destaque de capa. A originalidade e vigor da pintura de Chico atraiu galeristas como Giovanna Bonino da galeria Copacabana, onde ele passou a expor e vender suas telas.
Em 1963, ao final do curso no MAM-RJ, sua colega Alba Regina o convidou para assistir “As Aventuras de Ripió Lacraia”, segunda peça da “trilogia de cordel” de Chico de Assis, encenada pelo Teatro Nacional de Comédia, com Agildo Ribeiro fazendo sete personagens. Ali começaram a namorar, namoro que evoluiu para o casamento em 1965, realizado na igrejinha de Nossa Senhora da Glória, no Rio de Janeiro.
Alba e Chico tiveram cinco filhos: Ingra (1966, atriz, escritora e terapeuta); Cândida-Luz (1968, artista, produtora de cinema e esportista); Flor Violeta (1975, dançarina, professora de arte e pesquisadora); João Riso (1979, flautista e professor de música); Timóteo (1980, advogado e escritor). Alba foi sua grande companheira até o fim da vida.
O tempo no Rio de Janeiro foi de intenso aprendizado para o casal. Chico e Alba frequentavam as tardes memoráveis de encontros com o professor Ivan Serpa (RJ, 1923-1973), artista e intelectual que formou diferentes gerações da arte brasileira. Serpa reunia jovens artistas em sua sala ou no café do MAM-RJ para longas conversas conceituais. Eles iam também às vernissages da Galeria Relevo em Copacabana, de Jean Boghici (pioneiro do mercado da arte no Brasil), por onde passava a vanguarda das artes visuais, cênicas e o pessoal da bossa nova.
Leitora dos cadernos culturais – onde escreviam Rubem Braga, Cecília Meireles, Clarice Lispector, Carlos Heitor Cony e o melhor da literatura brasileira – Alba iniciava sua prática poética estimulada por Chico, e publicava na coluna Página Literária do Jornal da Bahia com o poeta Fernando Batinga, enquanto Chico expunha e trazia novidades, no ir e vir a Salvador.
Em 1966 Liberato foi convidado por Juarez Paraíso para realizar a 1a Bienal da Bahia. Foi um dos principais articuladores das duas primeiras Bienais de Arte da Bahia, em 1966 e 1968, junto com Juarez Paraíso e Riolan Coutinho. Chico e Juarez também participaram de maneira destacada da construção conceitual e das atividades da 3a Bienal da Bahia – assim como seus contemporâneos Juraci Dórea, Sante Scaldaferri e Rogério Duarte.
Chico assumiu a tarefa de convidar os artistas brasileiros mais renomados para participar da primeira Bienal baiana. Inclusive visitando-os nos seus ateliês pelo Brasil. Na volta de uma dessas viagens, vindo do Rio Grande do Sul, onde convidou o escultor Pedro Scosteguy, Chico encontra Alba de saída para a maternidade, onde nasceria a primogênita do casal, Ingra Liberato.
Entre os participantes da 1a Bienal da Bahia estavam Rubens Gerchman, Antonio Dias, Maria do Carmo Secco, Dileny Campos, Vergara, Hélio Oiticica, Lygia Clark. Participaram da primeira Bienal também Frans Krajcberg, Walter Smetak, Calasans Neto, Mestre Didi, Emanoel Araújo, Mario Cravo Neto e Rubem Valentim; e no júri nomes como Clarival do Prado Valladares e Mário Schenberg.
Em 1967, com Alba grávida da segunda filha e se afastando das atividades como professora no Rio de Janeiro, o casal retorna a Salvador, onde se sentiam mais seguros diante do endurecimento do regime de governo do país. O sucesso da primeira Bienal permitiu que Riolan, Chico e Juarez Paraíso realizassem a 2a Bienal da Bahia em 1968. Porém o governo militar fechou a exposição de abertura, confiscou e destruiu obras, encarcerou organizadores e abriu processos contra vários colaboradores.
Na Bahia, Chico colaborou com projetos diversos – inclusive para o icônico filme “The Sandpit Generals”, dirigido por Hall Bartlett, uma adaptação norte-americano para o livro “Capitães da Areia”. Rodado na Bahia em 1969 e finalizado em 1971, a película levou pela primeira vez uma história de Jorge Amado ao cinema com cores e som. Esse filme foi proibido no Brasil, mas visto por mais de 40 milhões de pessoas na antiga URSS, em meados dos anos 70, marcando toda uma geração de russos.
A convite de Domingos Leonelli, que foi Diretor de Criação de empresas de publicidade como Vox, Propeg, Publivendas e Engenho, entre 1967 e 1978, Chico desenvolveu logomarcas e peças institucionais para empresas e órgãos públicos, como a logomarca do Departamento Estadual de Trânsito da Bahia (DETRAN), que permanece até hoje.
Juarez Paraíso foi um grande amigo e parceiro de Chico Liberato durante toda a vida. Paraíso foi diretor artístico da importante Galeria Convivium, cuja proposta era expor arte de vanguarda. Além de Liberato, a galeria expunha obras de gravuristas baianos, de Eckenberger, Antônio Dias, Gerchman, Carlos Bastos, Zoravia Bettiol, Mario Cravo Neto, Presciliano Silva, e promovia cursos e oficinas. No famoso bar da Convivium se encontravam artistas e intelectuais como Edsoleda Santos, Elizabeth Rothers, Anna Georgina, Liana Bloise (fundadora da galeria), Emanoel Araújo, entre outros. Segundo Juarez, a galeria foi um local de resistência cultural contra o que ele chamou de “latifúndio cultural dos artistas oficiais da época”.
Segundo Flor Violeta, filha do casal, Chico sempre foi um multiplicador, disposto a aprender e compartilhar o que sabia. Acreditava na colaboração, e procurava envolver parceiros e a família nos projetos, como conta:
Principalmente no caso do cinema de animação, que eram projetos mais complexos, meu pai trazia a família para perto do trabalho. Todos se envolviam e cresciam artisticamente. Minha mãe estava sempre do lado, fazia junto. Ela assinou os roteiros dos filmes, e atuou em tudo onde era preciso a escrita: argumentos, storyboards, propostas. Minha mãe embarcava nas ideias, construía o esqueleto e dava palavras às formas e cores. Nesses projetos coletivos todos tinham participação, mas no que tange a pintura, os desenhos, a criação plástica, era um processo muito pessoal dele, um caminho só.
A parceria de Chico e Alba se dava na vida e na arte. Em 1970 Alba produziu uma obra com o rosto de Che Guevara, para uma exposição coletiva realizada na Praça da Piedade. O quadro foi confiscado pelo governo militar, e o autor da obra procurado para responder a inquérito. Com duas filhas pequenas em casa, o casal foi aconselhado por advogados e Chico assumiu a autoria da obra, sendo preso e processado. Os dois juntos desenvolveram projetos importantes, inclusive com parceiros como Sílvio Robatto (arquiteto e fotógrafo) e Lia Robatto (dançarina e coreógrafa), por exemplo.
Em 1971 realizaram a histórica ação artística “Interarte”, no Instituto Goethe, Instituto Cultural Brasil-Alemanha (ICBA), da gestão de Roland Schaffner. Foi construída uma casa de taipa no pátio do ICBA, onde aconteceram performances icônicas, envolvendo artistas de várias linguagens.
Fotos:
Interarte – Experimenta Baiana II. ICBA. Instalações com Lia Robatto, Salvador.1972.
Fonte: chicoliberato.com.br
Interarte – Experimenta Baiana II. ICBA. Instalações com Lia Robatto,
Salvador.1972. Fonte: chicoliberato.com.br
O espírito colaborativo marcou a atuação de Chico Liberato em todos os campos. Na sua gestão do MAM da Bahia, entre 1979 e 1991, ele retomou os princípios do museu original, como pensado por Lina Bo Bardi: um Museu-Escola, um museu-ação, “um lugar vivo e dinâmico, onde devem entrar luz e ar puro”.
Segundo Moniz (2019) pode-se sintetizar o programa museológico proposto por Lina para o MAM nas ideias de desenvolver ao máximo as atividades formativas, romper as fronteiras entre popular e erudito, e abrir as atividades à participação de todo tipo de público, independente da origem ou idade, pensando o museu como espaço aberto, colaborativo, um lugar de formação e gerador de conhecimento, um museu para todos.
Chico Liberato retomou essa proposta no MAM-BA de 1979. Antes um espaço restrito e pouco movimentado, o museu passou a ser um ambiente democrático, dinâmico, de visibilidade e de formação. Logo no primeiro ato Chico realizou a marcante mostra Cadastro. O projeto causou rebuliço na Bahia toda, permitindo que algumas centenas de artistas expusessem ao mesmo tempo no museu. Dali em diante foram realizadas exposições, seminários, movimentos marcantes para a Bahia e o Nordeste, tramados ao marulhar das ondas mansas de mar de Baía de Todos os Santos.
Foto: Jornal Correio da Bahia, 23 de julho de 1979. Fonte: chicoliberato.com.br
A “Exposição Cadastro” foi realizada ainda durante a ditadura. Qualquer pessoa, sem critério de exclusão, poderia cadastrar sua obra para ser exposta no museu, inclusive na sala principal. Pessoas de todo o estado, amadores, artistas reconhecidos e anônimos, participaram do projeto. Na perspectiva da arte – a despeito da opinião da mídia da época – o projeto era inovador, baseado na ideia de que todo ser humano é um ser criativo. Do ponto de vista museológico, o projeto rompeu com o paradigma de museu como instância legitimadora de artistas estabelecidos, e funcionou como um laboratório de compartilhamento poético. Como lembra o artista Vauluizo Bezerra:
Chico Liberato tinha uma visão de integração e atualização nos modos de produção de cultura. Num equipamento institucional como o MAM, e naquelas circunstâncias de “terra arrasada” provocadas pelas camisas de forças do regime militar, um dos primeiros atos de Chico Liberato foi o mapeamento do que se produzia na Bahia em artes visuais. (…) Depois vieram as mostras associativas, com um tipo de organização que hoje chamamos de Curadoria. Dentre estas mostras, fui convidado por ele a participar da “Mostra Sete”, chamada assim pela presença de sete artistas cujas linguagens em alguma medida eram tangenciais ou associativas. (…) Chico era a liga que tornava possível as ações daquela época.
Ainda durante sua gestão foram inauguradas as Oficinas do MAM, através de um projeto proposto pelo professor Pasqualino Magnavita (à época, Coordenador de Museus da Fundação Cultural do Estado) e pelo professor Juarez Paraíso (primeiro coordenador das Oficinas), junto à FUNARTE. No projeto inicial de 1963 para o MAM no Solar do Unhão, Lina Bo Bardi propunha que nele funcionasse o Museu de Arte Popular do Unhão, o Centro de Documentação da Arte Popular, o Centro de Estudos Técnicos do Nordeste e as Oficinas do Unhão.
Nas Oficinas de Arte em Série, inauguradas em março de 1980 por Chico Liberato, o MAM-BA oferecia cursos livres de xilogravura, litografia, gravura em metal e serigrafia. Com a introdução de técnicas de cerâmica e de escultura em madeira, muda-se a denominação para Oficinas de Expressão Plástica. E depois Oficinas de Artes Plásticas, com oferta de cursos de pintura e desenho. Entre os que passaram pelas Oficinas, como alunos e/ou professores, estão Hilda Salomão, Isa Moniz, Sônia Rangel, Florival Oliveira, Yedamaria, Marcia Magno, Lica Moniz, Stella Carrozzo, Gaio Matos, Paulo Rufino, Juarez Paraíso, Tonico Portela, Evandro Sybine, entre outras centenas de artistas de todas as linguagens, e diletantes.
Também na gestão de Chico Liberato foram realizadas no Museu de Arte Moderna da Bahia as duas primeiras edições do Salão Baiano de Artes Plásticas, depois chamado de Salões da Bahia, cujo prêmio Aquisição incorporava a obra vencedora ao acervo do MAM-BA, o que modificou o perfil das coleções do museu em diversos sentidos, e ajudou a legitimar a obra de artistas iniciantes de várias gerações.
O primeiro contato de Chico Liberato com os bastidores do cinema foi em 1972, na I Jornada Internacional de Cinema da Bahia (à época Jornada Baiana de Curta-metragem), quando, a convite do documentarista e professor Guido Araújo, criou a identidade e toda programação visual do evento. Até hoje o Tatu idealizado por Chico, com colaboração do artista Zu Campos, é o símbolo da Jornada da Bahia.
A Jornada Internacional de Cinema da Bahia é o terceiro mais antigo festival de cinema do Brasil, atrás dos festivais de Gramado e de Brasília. Formou gerações de realizadores do audiovisual baiano. Sua primeira edição foi local, no ano seguinte regional e a partir daí um local de resistência do cinema nacional, onde cineastas, intelectuais e interessados discutiam temas referentes ao cinema e à cultura nacional, e entidades e associações se organizavam, como os movimentos de cineclubistas e a Associação Brasileira de Documentaristas.
Entre os parceiros de Guido Araújo estava Cosme Alves Neto, diretor da Cinemateca do MAM-RJ, que tinha contato com cineastas e produtores do mundo todo, e também Roland Schaffner, diretor do Instituto Goethe, o ICBA, centro de resistência cultural durante a ditadura. No Instituto alemão, nas primeiras edições, foi possível exibir filmes que sofriam intervenção da censura nos outros festivais. Chico participou da Jornada por quase quatro décadas.
Naquele contexto da Jornada, Chico começou a experimentar criar e animar personagens, e roteirizar. Os curtas “Ementário”e “Experimentos” foram produzidos com recortes, desenhos, retratos, uma mesa de luz improvisada e câmera fotográfica, com apoio de Silvio Robatto. Também começou a compartilhar tudo que sabia, e estava aprendendo, nas oficinas que realizava.
Além da temática potente do sertão mítico, tecnicamente o artista renovou no uso de quantidade menor do que 24 frames por segundo, e novas dinâmicas de movimento em sequência, criando uma construção não-linear. A experiência com a imagem em movimento tornou Chico Liberato uma das maiores referência no campo do cinema de animação do Brasil, com destaque para o longa de animação “Boi Aruá”, lançado na Jornada de Cinema da Bahia de 1983, seu terceiro e mais conhecido filme, sobre o mito do Boi na caatinga, que ganhou diversos prêmios nacionais e internacionais, e fez história na cinematografia brasileira.
Foto: Boi Aruá. 1982. Acrílica sobre papel. Fonte: chicoliberato.com.br
Chico Liberato teve amizade e parcerias com artistas visuais, dançarinos, poetas e também músicos como Ernst Widmer, Rufo Herrera, Elomar, Rinaldo Rossi e Xangai. O filho de Chico, João, que é músico e pesquisador, fez um estudo da iconografia musical na obra do pai, e fala da importância da presença da música e seus personagens na obra de animação de Chico Liberato, onde aparecem músicos, danças, instrumentos da cultura popular, como descreve:
(…) surge ao longo da vida a partir do seu interesse pessoal pelo universo sonoro, da sua amizade e parceria com músicos (…), e principalmente pelo seu reconhecimento da importância da música na cultura popular do Brasil e da América Latina. (…) sanfoneiros, zabumbeiros, aboiadores, tocadores de triângulo, tocadores de berimbau, flautistas, violeiros, rabequistas, rezadeiras, dançarinos e cantores. (…) o forró, o samba, o aboio, as canções religiosas, a capoeira, o samba-reggae, a música dos índios amazônicos e andinos, acabaram por se tornar parte natural de sua busca, de sua vida e consequentemente de sua obra.
O longa de animação “Ritos de Passagem”, dirigido, roteirizado e animado por Chico Liberato, foi finalizado em 2013. Como a maior parte da obra do artista, se baseia em personagens do imaginário do sertão nordestino, envolvidos nas dinâmicas de esperança e justiça, tradições e conflitos. Com trilha sonora de João Omar e João Liberato gravada pela Orquestra sinfônica da Bahia (OSBA), o longa teve a participação de atores como Jackson Costa, Harildo Deda, Caco Monteiro, Ingra Liberato, Marcelo Praddo, Carlos Betão, Igor Epifanio e Pisit Mota, dando voz aos personagens.
Ainda em 2013 Chico Liberato foi homenageado na 12ª edição do Monstra – Festival Internacional de Cinema de Animação de Lisboa, comemorando o trigésimo aniversário do clássico “Boi Árua” (1983), primeiro longa-metragem de animação do brasileiro. Durante o evento foi feita uma retrospectiva de toda a obra de Chico, de “Boi Aruá” à “Ritos de Passagem”, que teve na Monstra a sua estreia europeia.
Entre 2013 e 2014 Chico Liberato e artistas contemporâneos seus como Juarez Paraíso, Juraci Dórea, Sante Scaldaferri e Rogério Duarte tiveram uma atuação importante junto ao MAM-BA e a 3a Bienal da Bahia – projeto coordenado pelo museu, após um intervalo de 46 anos desde sua 2a edição.
Tanto a gestão de Marcelo Rezende no MAM entre 2013 e 2015, quando a Bienal de 2014 dinamizaram diferentes espaços físicos e simbólicos, considerando origens conceituais, criadores, agentes ligados ao museu e à bienal baiana, buscando para isso aproximação com esses realizadores das décadas de 1960 e 1970.
Os processos de curadoria colaborativa no museu e na bienal tiveram a participação de agentes, artistas e público, com a ideia de repensar as experiências vividas por esses artistas, relacionando as percepções do passado e sua retomada no presente. Foi realizado um profundo trabalho de pesquisa trazendo à luz importantes processos relativos às Bienais da Bahia de 1966 e 1968, e ao museu de Lina Bo Bardi e Chico Liberato.
Em 2015, quando o casal Chico e Alba completaram 50 anos de casados, “Amarilis” saiu do papel. Pela primeira vez o tema principal de um filme de Chico foi uma história de amor. O curta de 10 minutos, lançado em 2016, com argumento e roteiro de Alba Liberato, fala de encontros, desencontros, conflitos, harmonia, desejo de recomeçar, construção contínua de uma relação de afeto. A trilha sonora de piano e flauta de João Liberato se combina delicadamente à estética popular de cores fortes, resultando em uma pequena jóia de simplicidade e beleza, que participou de diversos festivais.
Em dezembro desse mesmo ano Liberato foi violentamente atacado em sua casa por bandidos, até perder a consciência. O incidente não impactou muito o ritmo de trabalho de Chico. Embora tenha passado a pintar obras um pouco menores do que os grandes quadros que costumava fazer, continuou produzindo, participando de festivais, rodas de conversa e outros eventos culturais, onde muitas vezes foi homenageado.
Em 2018 o casal Liberato recebeu homenagem da Mostra Cinema Conquista, com exposição baseada na obra de Chico, mesas de conversa com os artistas, e concerto da Orquestra Conquista Sinfônica, sob direção do maestro João Omar e participação do flautista João Liberato.
Aos poucos, Chico Liberato foi se deixando levar pelo Tempo. Diminuiu radicalmente o ritmo de trabalho, passou a desfrutar ainda mais da companhia dos netos, e principalmente deixou fluir a sua natureza mais etérea, o contato com o universo subjetivo, soltando os pés do chão e alcançando o céu.
*Mais detalhes e imagens sobre a vida e a obra de Chico Liberato estão disponíveis nas plataformas chicoliberato.com.br e chicoliberato.com.br/site/casachicoealbaliberato
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CASA Chico e Alba Liberato: Virtual tour 360o. 2021. Disponível em: https://www.chicoliberato.com.br/site/casachicoealbaliberato. Acesso em: 10 jan. 2023.
CHICO LIBERATO: a vida é da cor que pintamos. 2021. Disponível em: http://www.chicoliberato.com.br. Acesso em: 10 jan. 2023.
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Sites oficiais sobre a vida e a obra de Chico Liberato:
chicoliberato.com.br
chicoliberato.com.br/site/casachicoealbaliberato
Autores(as) do verbete:
Alba LiberatoeLuciana Moniz de Aragão
Data de inclusão:
28/02/2023
Datas de revisão / atualização:
28/02/2023;
D536
Dicionário Manuel Querino de arte na Bahia / Org. Luiz Alberto Ribeiro Freire, Maria Hermínia Oliveira Hernandez. – Salvador: EBA-UFBA, CAHL-UFRB, 2014.
Acesso através de http: www.dicionario.belasartes.ufba.br
ISBN 978-85-8292-018-3
1. Artes – dicionário. 2. Manuel Querino. I. Freire, Luiz Alberto Ribeiro. II. Hernandez, Maria Hermínia Olivera. III. Universidade Federal da Bahia. III. Título
CDU 7.046.3(038)